Tão em voga nos últimos meses, “pedaladas fiscais” pode
ser considerada como “drible” econômico praticado pelo Tesouro Nacional, que
atrasa o repasse de dinheiro para os bancos públicos, privados e autarquias,
com o intuito de enganar o mercado financeiro, dando a impressão de que o
governo está com despesas menores. O objetivo é “aliviar”, momentaneamente, as
contas do governo. Por outro lado, as dívidas do governo com os bancos e
instituições financeiras aumentam.
A pergunta que se faz: a pedalada fiscal é crime de
responsabilidade? Bem, do ponto de vista jurídico, entendo que a pedalada
fiscal é uma pratica ilegal, tida como um crime contra a Lei de Responsabilidade
Fiscal (Lei Complementar 101, de 4 de maio de 2000), que regulamenta todas as
movimentações de finanças feitas por entidades federais, estaduais e
municipais. A mencionada lei visa a transparência dos gastos públicos.
No caso ora em discussão no impeachment da presidente
Dilma Roussef está sendo levado em consideração duas acusações: a) Abertura
indevida de créditos suplementares; b) Empréstimos contraídos junto a bancos
estatais e ao FGTS. Diz-se que o Governo Dilma tomou emprestado R$ 19,6 bilhões
do BNDES, R$ 13,4 bilhões do Banco do Brasil, R$ 7,6 bilhões do FGTS (Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço), além de R$ 717 milhões da Caixa Econômica
Federal para o Bolsa Família, R$ 936 milhões do mesmo banco para abono salarial
e mais R$ 87 milhões (ainda da Caixa) para seguro-desemprego.
O artigo 36 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz:
Art.
36. É proibida a operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e
o ente da Federação que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo.
Bem, é de bom alvitre ressaltar que os créditos
suplementares são acréscimos de recursos para uma finalidade já constante no OGU,
LOA e LDO (autorização para que o governo possa gastar mais durante o
exercício, obedecendo a meta de superávit primário). Assim, o governo tem que
obedecer a meta de resultado primário ou superávit primário (receita e
despesa), ou seja, o governo arrecada “x” e gasta “y”.
No caso da presidente Dilma, em 2015 a meta do governo
era de R$ 55.3 bilhões. Na verdade chegou-se o final do ano com um déficit
primário de R$ 112 bilhões. Uma balbúrdia total. Mesmo assim, embora sabendo que
não economizaria o previsto (não teria superávit primário), editou vários
decretos (as pedaladas fiscais). Tudo sem o aval do Poder Legislativo que, ao nosso entendimento, foi o erro maior.
A Constituição Federal de 1988 em seu art. 167, inciso
V, afirma:
Art.
167. São vedados:
V
- a abertura de crédito suplementar ou especial sem prévia autorização
legislativa e sem indicação dos recursos correspondentes;
Além
disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei nº 1.079/50) menciona em seus
artigos 10, inciso IV e VI:
Art.
10. São crimes de responsabilidade contra a lei orçamentária:
IV
- Infringir, patentemente, e de qualquer modo, dispositivo da lei orçamentária.
VI
- Ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites
estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de
crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal; (Incluído pela Lei
nº 10.028, de 2000)
....
Art.
11.
II
- Abrir crédito sem fundamento em lei ou sem as formalidades legais;
III
- Contrair empréstimo, emitir moeda corrente ou apólices, ou efetuar operação
de crédito sem autorização legal.
Por fim, a Constituição Federal/88, em seu art. 85,
incisos V e VI define de uma vez por todas o que venha a ser crime de
responsabilidade fiscal:
Art.
85. Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República
que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:
V
- a probidade na administração;
VI
- a lei orçamentária;
Entendemos
que as pedaladas fiscais constituem, sim, crime de responsabilidade, crime de
responsabilidade contra a lei orçamentária. Essas pedaladas fiscais, usadas
abusivamente pelos estados, é que levaram à falência a maioria dos bancos
estaduais.
A
Lei de Responsabilidade Fiscal, em boa hora, acabou com a ‘farra orçamentária’,
tipificando-as como crime de responsabilidade. Ora, o fato de governos
anteriores terem praticado pedaladas fiscais não exclui a culpabilidade do
governo que foi autuado. Nenhum governante pode ficar livre de punições, no
caso da prática de crimes, seja crime de responsabilidade, seja crime comum. A impunidade dos maiores leva à impunidade
geral. Não se pode jamais permitir que se instale a balbúrdia, o caos
administrativo, pois as instituições públicas se desgastam e perdem
credibilidade.
(*)
Advogado especialista em Gestão Pública